quarta-feira, 18 de maio de 2011

«Quem sou? Nem sempre sei.»
«Claro que sabes, filho! Que disparate!»
 Quando me questiono acerca de mim, não me refiro, claro, à minha identidade, expressão física e psíquica que dou e me convenço ter, a auto imagem. O facto de ser parecido com os meus progenitores mais directos, contigo e com o pai, em termos de características físicas, o que me torna mais igual, a todos os outros, são as que carrego e trago no ínfimo de mim, numa codificação genética ancestral. Parente próximo dos que fazem parte da minha espécie, mas não tão afastado dos que também partilham o mesmo habitat.»
«Não entendo, o que queres dizer, com essa conversa.»
«Não somos tão diferentes uns dos outros, como julgamos. Algumas particularidades nos diferenciam; uns louros, outros baixos, outros morenos, outros peludos, outros com os olhos rasgados, outros belos, etc. As características físicas mais evidentes, estão relacionadas, também, com as ambientais, onde essas pessoas nasceram, ou seus progenitores mais directos. Nós somos constituídos por biliões de células. Os seres vivos são constituídos por diversos tipos de moléculas, que se organizam formando células. Essas moléculas interagem entre si, harmoniosamente. Tal interacção é regulada pelo material genético existente nas células. A molécula de ADN é constituída por milhares de átomos, diz-se que é uma macro molécula. É como se fossemos um macro cosmos e o átomo o micro cosmos em nós. Conhecemo-nos no que vemos e é pouco. Imagine a mãe, o universo; nós, o universo, constituído por milhões e milhões de galáxias. Cada galáxia é constituída por um número incalculável de constelações. Cada constelação constituída por muitas e muitas estrelas. Cada uma, centro de um sistema de planetas e outros corpos celestes, que giram em seu torno. Na base está o átomo, com o seu núcleo, que poderá ser comparável ao Sol, ou outra estrela. O átomo é a menor partícula que ainda caracteriza um elemento químico. No centro de um átomo está o seu núcleo, que apesar de pequeno, contém quase toda a massa do átomo. Os prótons e os nêutrons são as partículas nele encontradas, cada um com uma massa atômica unitária. Existem várias camadas em torno do núcleo e nelas estão os elétrons que orbitam o núcleo. Os eléctrons poderão ser equiparados aos planetas. As células às constelações… Somos bem mais complexos do que, alguma vez possamos imaginar. E acredito que a energia que acontece em nós se estende para além de cada “universo” . A inteligência é bem mais do que os meros exercicios efectuados pela mente humana.Voltando a trás; há sempre a tendência para se identificar culturalmente uma pessoa pelos seus traços físicos, pela a aparência, o que melhor conhecemos, o que é visível.»
Tinha uma tia, já falecida, irmã da minha avó paterna, que detestava quando lhe perguntavam se era inglesa, ou filha de… Respondia, acentuando de proposto o seu sotaque «Sou alentejana! Nasci em Cuba, mas do Alentejo!»
«Lembra-se, mãe da tia Gabriela? Loura, alta, magra, muito branca!... Os pais e o resto dos irmãos, incluindo a minha avó, eram o oposto; alentejanos de gema.»
«Sim, a tia Gabriela. Muito seca, fria, snobe, nunca sorria! Mais parecia uma alemã, desculpa!»
«Eu gostava dela! Não era assim, como diz, mãe. Para mim, sempre foi carinhosa e simpática! A mãe é que não gostava dela e sempre lhe mostrou má cara. Por que ela, que saiba, nunca lhe fez ou disse nada que a magoasse.»
«Eu, má cara?!»
«É nisto, neste tipo de reacções que não nos conhecemos e nem sabemos por que assim reagimos. A persona está condicionada pelo inconsciente. E é o nosso lado impessoal, que nos dificulta a ascensão do Self. Li no outro dia um artigo sobre psicologia Humanista e Transpessoal. Faz sentido. Se ela nunca lhe fez mal, possivelmente ela perturbava algo que em si está mal resolvido, e que a mãe nem tem consciência. Deveremos ter cuidado com o que dizemos, por que quando nos queremos evidenciar, é normalmente para ocultar, ou compensar alguma insuficiência. Mesmo, quando nos fazemos bons, humildes, verdadeiros, sérios… É por que nos queremos convencer que somos quase deuses, para nos esquecermos dos demónios que nos habitam. Não há gente boa, nem má. Somos todos iguais! Há pessoas mais conscientes que outras, que confrontadas, com a realidade, com os seus problemas, com os seus defeitos, os enfrentam, de acordo com as suas necessidades, mas respeitando o todo, percebendo que é preciso trabalhar a individualidade e contribuir, partilhar com os outros e respeitá-los. O inconsciente colectivo pesa-nos e é uma milenar herança, faz parte de um código de valores inscrito no todo cultural, talvez genético, que nasce connosco. Enquanto no inconsciente pessoal temos os complexos, no colectivo, os arquétipos.»
«Ai, filho, que conversa! Eu sou uma excelente pessoa; honesta, verdadeira, sempre pronta a ajudar… Agora, vem-me dizer que não há gente má! E os assassinos?! Eu sou capaz de matar alguém?»
«Não digo, que seja má e não haja a intenção de ser isso tudo. Mas, quando menos esperamos, e sem querer, fazemos o que não devemos, agimos contrariando todos os bons ensinamentos e as boas intenções. Quanto a ser assassina, é uma questão de valores. Matar alguém da mesma espécie é crime, mas de outra, e quanto mais pequena for, menos é notada. E se for uma melga, então, será uma heroína; de si mesma!»
«Eu, assassina de melgas?! Mas o que te deu, hoje. Que conversa! Está doente!»
«Mãe, o que é importante é vivermos conscientes do que somos: defeitos e potenciais, e aceitarmos os outros. E criarmos condições para que outros se integrem e vivam em sociedade, independentemente das suas diferenças e problemas. A mãe acha normal que nos nossos dias ainda se descrimine, por razões raciais, doença, idade, status social… Há vezes penso que havendo tanta evolução tecnológica, tanta informação, ainda somos tão provincianos emocionalmente, valorizando demais a imagem em detrimento da essência, o grande núcleo da célula da existência humana.

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