quarta-feira, 18 de maio de 2011

Hoje, faço quarenta anos! Já há alguns anos que desisti de festejar o dia do meu aniversário. Lembro-me sempre do acidente que tive quando era pequeno. Perdi-lhe o gosto. Sinto-me sempre angustiado, e sem querer, vem-me sempre à memória tudo o que aconteceu naquele fatídico dia. Mas hoje, convenceram-me a celebrá-lo! Sinto, não sei por quê vontade de o fazer. Talvez tenha a ver com a idade; quarenta anos! O tempo passa depressa. E não me sinto assim tão acabado. Quando era jovem e deparava-me com pessoas com esta idade, achava-as velhas, mais prontas para bater as botas, do que eu agora, que ainda sinto ter uma vida, ou duas, pela frente.
Há algum tempo, que venho a amadurecer a ideia. A minha mãe, constantemente me fala, que este ano é que é, tenho de fazer uma grande festa e convidar a família, os amigos, alguns colegas de trabalho… Preocupa-se muito com o meu bem-estar. Quer sempre recompensar-me de alguma coisa, que ela ache que me falta, que não me deu, ou possivelmente por algum sentimento de culpa, o que não deveria ter feito ou dito, sem importância, mas que na ideia dela se tem vindo a tornar, cada vez mais evidente, assim como a sua fragilidade psíquica e física… Desde que a Celeste nos deixara, ela assumiu mais o papel de mãe, já depois de ter regressado do colégio, e tornou-se um pouco obsessiva, na protecção e com os meus problemas, a minha vida. Eu tento percebê-la e por a conhecer tão bem, evito contar-lhe tudo, para que ela não se preocupe de mais. Por vezes quer ajudar, mas complica. Não é exagero, mas talvez há dois anos, que me anda a pressionar, para que eu festeje os meus quarenta anos. É uma meta, ou uma desculpa. E eu talvez por tanto a ouvir, que me sinto conformado e sinceramente até com alguma vontade de os celebrar.
Tinha pensado em viajar por esta altura. Ir sozinho dar um grande passeio. Ainda não conheço Itália. É um país que tenho vontade de um dia, ainda ir. Gosto do som das palavras, dito, por aquela gente do sul, de Nápoles, também da pronúncia dos romanos, do Vaticano, Miguel Ângelo, Pizza, Veneza, Pompeia… Tanta coisa que gostaria de visitar! ...
Quando pensei marcar a viagem disse-lhe, ao de leve, que tinha intenção de viajar, mas ela concordando, não me deixou terminar, com receio que, o que lhe viesse a dizer sobre o passeio, coincidisse, com a altura do meu aniversário, tendo logo arrematado com uma frase que frequente e espontaneamente lhe sai: «Que feliz ideia, meu filho!», acrescentando que me ofereceria as passagem, como presente do quadragésimo ano de vida, mas que lhe teria de dar a alegria de, neste ano, fazer uma grande festa. E eu, incapaz de a esmorecer, acabei por concordar e sentir a enorme alegria que lhe saía pelos olhos e como era bonito o seu sorriso, de tão contente, e tudo se transformou num apertado e prolongado abraço, com muitos beijinhos pelo meio. Na verdade, não fui somente eu a nascer, mas também ela a dar à luz. E mais do que um jantar, um bolo com velas, é haver motivo para juntar tanta gente que de nós gosta tanto, e nos têm acompanhado ao longo destes quarenta anos, e vivido connosco, alguns, mesmo à distância, acontecimentos e situações, também os menos agradáveis.
Quarenta anos! Sempre a crescer e à procura do caminho. O meu caminho. Um caminho solitário, mas não egoísta, julgo eu. Tento ser coerente na minha conduta. Ser credível, sem que me preocupe muito com o olhar dos outros. Só de alguns, por que nem todos destes, sei quem são. Não sou perfeito, mas tento-me melhorar todos os dias e não entrar em contradição comigo mesmo. Procuro ser exemplar, organizado, pontual, justo, honesto, correcto, ter capacidade de diálogo, aceitar os outros como são e a vida como se mostra, nem sempre bela, (talvez por minha culpa) … Ser concreto! …
Mas se procuro ser, é por que ainda não sou. Como animal racional, cabe-me fazer escolhas, saber distinguir o bem do mal. Nem sempre reconheço o mal como mal e o bem como o melhor. Nem sempre sei o que sou, ou se sou aquilo que pretendo ser. Mas caberá aos outros avaliar a minha conduta, nesta caminhada de quarenta anos! Também me (re)vejo nos outros e tento não acreditar demasiado nas minhas convicções, assim como em todos os que teimam no que se afirmam e como o fazem. Nem sempre agimos de acordo com o que dizemos; somos muito tolerantes, mas na primeira oportunidade, instintivamente reagimos, concordamos sobre a importância do trabalho em equipe, mas por insegurança ou medo, recolhemo-nos às tarefas solitárias, achamos que temos capacidade para amar, viver em partilha, mas acabamos por investir pouco, culpabilizar o(s) outro(s), fazermo-nos passar por  vitimas e convencidos, incapazes de olhar para dentro, que os relacionamentos que faliram, foi por culpa do(s) parceiro(s). Tendo ser coerente; agir de acordo com o que prego! Tento!
Tomei então, de uma forma partilhada a decisão livre e autónoma de celebrar o meu aniversário. Só se festeja uma vez por ano o nascimento, mas eu tenho a pretensão de renascer sempre que me é pedido e posso.
Onde andas tu? Deixa-te de divagações! O que é que te deu, agora?! Lá por que fazes quarenta anos! Cai à terra e vai mas é ajudar a tua querida mãezinha, seu palerma.
«Filho, onde estás? Vem cá!»
E lá vou eu para a cozinha! Logo, ao jantar já estou morto!
«Sim, mãe, vou já!»
 Ela já planeou a ementa. Os doces como sempre são muitos, sem esquecer o pudim-mentiroso e o arroz-doce. Não tenho mão para pratos muito elaborados, mas safo-me como ajudante, tanto a preparar os alimentos, sob as suas ordem, como a lavar a muita loiça que suja. Mas divirto-me sempre muito, mesmo quando a vejo enervada, pelo resultado final das iguarias, não corresponder ao por que por si fora idealizado e tento sempre de imediato, convencê-la, de que o sabor conta mais do que o aspecto, mas sem nunca conseguir.
«O teu pai já te ligou a dar os parabéns?»
«Sim, mãe! Como sempre o pai liga-me, neste dia para me perguntar como estou e dizer que gosta muito de mim, tem muitas saudades, se lembra muito, todos os dias, que eu existo e conte muitos e bons… Eu agradeço e respondo-lhe, dizendo, que também gosto muito, penso muito, todos os dias, e que ele veja, ou comunique, e um até para o ano!»
«Mas ele, também te tem ligado pelo Natal?!»
«Sim, mãe, também! Sempre!»

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